sábado, 26 de janeiro de 2008

sobrinha, carnaval e punk rock

De vez em quando saio nos finais de semana com minha sobrinha de 12 anos, Maria Antônia. Ela fica toda animada, faceira como é, adora passear, e logo pergunta: “a gente vai de quê, tia?” Pergunta já sabendo a resposta, pois não tenho carro, só ando de ônibus, táxis só em situação de emergência, ou quando volto tarde da noite. E eu respondo: “De 'busu', claro”. E ela sorri, divertindo-se com minha resposta.

Hoje à tarde fomos pro Bairro do Recife, para quem não conhece, é o bairro onde nasceu Recife, pertinho do porto, e onde, no carnaval, rola muito frevo, maracatu, samba, coco de roda, ciranda, xous de roque, etc e tal. Ela, minha sobrinha, estava doidinha pra ver o agito do carnaval que já tá frevendo por aqui mas como fomos muito cedo, por volta das cinco, não estava rolando nada, ainda. Mas já tem muito turista na cidade, muita gente circulando e algumas batucadas de samba e maracatu. Perguntei a ela aonde queria ir e ela me disse: “Vamos pro Marco Zero, tia”. E lá fomos nós pro Marco Zero, um grande pátio aberto onde acontecem muitas apresentações no carnaval e que fica de frente pro mar. Compramos pipoca e sentamos na mureta de granito olhando para o mar e seus arrecifes. Uma turista se aproximou, sentou ao meu lado e vendo vários barquinhos levando gente para os arrecifes, perguntou:

“O que é que tem do outro lado?”
“Tem várias esculturas de um famoso artista plástico daqui, Francisco Brennand, e mais adiante, à direita, tem o Bar do Dique, muito legal”.
“Ah.... mas aqui também é um porto?”
“Não, não, os navios que chegam aqui atracam mais à direita, porque aqui não tem profundidade suficiente pra navios de grande calado, inclusive este espaço de exposição aqui ao lado foi projetado para ser o terminal de passageiros, caso navios aportassem aqui. Faltou melhor planejamento do governo”.

A moça me ouviu com muita atenção, pouco depois agradeceu as informações e foi embora. Eu e Antônia comemos a pipoca todinha e fomos andar pelo bairro, fomos parar na Livraria Cultura, juntinho do Paço Alfândega, fui dar uma olhada nos lançamentos e minha sobrinha foi direto ouvir cds, o que fiz um pouco depois. Apesar de ouvir boa música em casa, infelizmente ela também ouve e gosta, o que é pior, de muita coisa ruim, essas baboseiras que predominam nas rádios, atualmente. Não vou nem dizer o quê, porque algum leitor ou leitora pode gostar e não quero magoar ninguém.


Aproveitei a oportunidade pra lhe mostrar alguns sons, que considero de qualidade e que ela nunca ouvira: música cubana, mexicana, até da Turquia. Pois não é que ela curtiu, ela gosta de dançar e eram todas músicas ótimas pra mexer o esqueleto e rebolar. E ela ficava num fone de ouvido a uns dois metros de distância de mim e eu fazia gestos com a mão dizendo pra ela ouvir a terceira faixa e ela ouvia e fazia o gesto de "jóia”. E eu rebolava e ela rebolava e a gente ria junto. Ela fez sinal pra eu olhar pra um cara com uns dreads enormes e lindos! Ela sabe o quanto eu gosto de dreads. E eu reconheci que era Cannibal, vocalista da banda Devotos, da periferia do Recife mas na hora não comentei quem era ele. Antônia sentiu vontade de tomar sorvete e subimos pro primeiro andar da livraria, nos deliciamos com a guloseima e depois saímos. Enquanto atravessávamos a ponte Maurício de Nassau ela disse toda manhosa:

“Ô, tia, vamos pedir pro papai vir buscar a gente de carro”
“De jeito nenhum, viemos de busu e vamos voltar de busu”

Queria que ela aprendesse a andar por essa cidade à pé, porque só se conhece verdadeiramente uma cidade andando à pé. E alguém que não atravessa as pontes do Recife andando não pode se considerar recifense. Depois da ponte, logo alcançamos a parada de ônibus e não tardou pro nosso busu passar. A caminho de casa fomos conversando e então comentei com ela que aquele cara de dreads era vocalista de um banda de roque do Alto José do Pinho, junto do Morro da Conceição, periferia do Recife. Ela, evidentemente, nunca tinha ouvido falar da banda e eu lhe disse que era uma banda de punk rock e que tinha uma música do primeiro disco deles que dizia: “punkrockhardcore sabe onde é que faz, lá no Alto Zé do Pinho, é do caralho!” Ela adorou a música, principalmente a parte final: “É do caralho!” Criança adora falar essas coisas, falar palavrão, fala com um prazer enorme. E quando descemos do ônibus ela foi até em casa cantando a música. Prometi a ela que quando ela fosse um pouco mais velha a levaria para um xou da Devotos, coisa que há muito tempo não faço porque só vai a moçada dos trinta anos pra baixo. Mas acho que nunca vou deixar de curtir cantar e ouvir aquele...”punkrockhardcore sabe onde é que faz, lá no Alto Zé do Pinho...” e o público respondendo com o maior tesão: “...É DO CARALHO!!!”

7 comentários:

Anônimo disse...

Recife calling - and burning? rs...
desse passeio para a 'piração', quando ela vir aquela capa "daquel" disco, vai ser só um pulo! e ainda vai inverter: ela é que vai te chamar "Hey, ho, let's go!"
também comecei a aplicar Fernandinha desde já, nas primeiras chupetas. gostou de Bob Marley que só vendo - até sacudiu os bracinhos com Three Little Birds...rs...
beijão

Moacy Cirne disse...

Carnaval Recife Frevo.
Frevo Recife Carnaval.
Beijos Abraços Beijos.
Abraços Laços Abraços.

Cé S. disse...

Puxa Sandra, que passeio legau !

Eu e Ane também só andamos de coletivo, trêm e busango. Prestamos atenção um no outro, não na estrada.

E andamos pela cidade com muito gosto, também.

AB disse...

Quero ir para Recife, pronto!

Anedanca disse...

Fiquei vendo as cenas na minha cabeça como em um filme.. Tua tarde foi uma super produção para mim! Adorei Madrinha,.. e eu tb sou tua sobrinha, tb tens que me levar pra passear!!
:D
:D
:D

Vais disse...

Olá Sandrinha,
moça, que delícia!
Aplicando a menina Maria Antônia nos troços, heim titia!
Você falou muito bacana, conhecemos é andando à pé, e lembrei de uma música do Ira! 'tire os pés do chão ponha os pés na estrada'
eu estive nessa terra sua uma vez, em 2001, foram quatro dias participando de um encontro de mulheres, a última noite fomos dançar num casarão na parte antiga da cidade.
dancei até de madrugada.
viajo, vi tudo aí pra cima
eu adoro suas artes
a passista se lambuza de sonhos
beijão

Ane Brasil disse...

Nada como uma educação primorosa para uma criança... punk rock é mesmo du caralho!
Quando eu for pra Recife me leva pra passear também? heheheh (pô só não vou te chamar de tia heheheh)
Cara, vc tá contruibuindo pra caramba pra fazer dessa tua sobrinha uma pessoa feliz e esclarecida... deveria estar entre os direitos fundamentais da criança uma tia como você.
Sorte e saúde pra todos!